Na Câmara, entidades sindicais criticam vínculo entre deputados e empresários
Representantes de centrais cobram durante debate no plenário aprovação de projetos de interesse dos trabalhadores, como a redução da jornada e o fim do fator previdenciário
por Hylda Cavalcanti, da RBA publicado 06/05/2014 19:57, última modificação 07/05/2014 08:23
Além de cobrar a aprovação de projetos, representantes pediram que se barre proposta sobre terceirização
Brasília – Durante quase três horas, na tarde desta terça-feira (6), o plenário da Câmara dos Deputados foi ocupado por representantes de diversas entidades sindicais que subiram à tribuna e tiveram direito a discutir, com os parlamentares, os projetos de interesse dos trabalhadores que tramitam na Casa há anos. O balanço feito a partir desse debate – na prática, uma comissão geral, conforme é chamada pelo regimento interno da Câmara – não foi nada bom para o Congresso Nacional: mais de 600 proposições, conforme informações da mesa diretora, voltadas diretamente para melhorias nas relações de trabalho, encontram-se em tramitação na Câmara e no Senado. Algumas delas estão sendo analisadas há quase 20 anos.
Os representantes das entidades lembraram o que disse recentemente o presidente da Casa, deputado Henrique Alves (PMDB-RN), quando afirmou que a Câmara é um lugar de deliberação e debate, e pediram aos deputados compromisso com os trabalhadores que os elegeram. Aproveitaram, também, para criticar a influência do empresariado na discussão destas propostas, e combater o constante argumento de que podem ter impacto negativo nas finanças do país ou ocasionar número grande de demissões.
Ao longo dos pronunciamentos, lembraram projetos emblemáticos que nunca foram votados e as manifestações feitas nas ruas em junho passado, que resultaram em vários pedidos ao Legislativo brasileiro e provocaram o que foi chamado, na época, de “agenda positiva”, um compilado de propostas que jamais chegou a ser levado adiante na íntegra.
Entre as matérias mais reivindicadas, destacaram-se a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 231, de 1995, que reduz a jornada máxima de trabalho para 40 horas e aumenta a remuneração por hora extra para 75% do salário; o Projeto de Lei Complementar (PLP) 8, de 2003, que define o justo motivo autorizativo e o justo motivo subjetivo nos casos de saída dos trabalhadores do emprego; a PEC 555, de 2006, que acaba com a contribuição dos inativos; e o Projeto de Lei (PL) 3299, de 2008, que extingue o fator previdenciário.
Em efeito inverso, voltou a ser criticado e foram feitos vários apelos para que não seja aprovado o PL 4330/2004, que regulamenta a terceirização.
Agenda anual
Para o deputado Vicente Cândido (PT-SP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) e responsável pela convocação do encontro, estes são apenas alguns dos itens mais importantes. O deputado afirmou que somente na sua comissão tramitam atualmente cerca de 150 proposições voltadas para os trabalhadores e sugeriu que esta agenda passe a ser comum na Casa, todos os anos, na semana que sucede as comemorações do Dia do Trabalho.
O presidente da CUT, Vagner Freitas, chamou a atenção para a importância de uma pauta mais ampla. Ele citou várias das matérias aprovadas e em apreciação. “Nossas propostas e reivindicações refletem o país que queremos e estamos contribuindo para construir para nós, nossos filhos, netos e gerações seguintes. Queremos um país desenvolvido, com sustentabilidade, justiça social, inclusão, emprego e trabalho decente”, afirmou.
Freitas destacou a redução da jornada de trabalho de 44 horas para 40 horas semanais sem redução de salário e explicou que a medida pode vir criar 3,2 milhões de novos empregos. De outro lado, ele estima em bem pequeno o impacto dessa redução no custo das empresas com pessoal (1,32%).
De acordo com o presidente da CUT, a produtividade do trabalho no Brasil cresceu 92,7% desde 1988, e um dos principais fatores foi a redução da jornada de 48 horas para 44 horas semanais. Esse crescimento, no entanto, não foi incorporado aos salários que, apesar da recuperação dos últimos anos, representam 64,6% do valor de 1989. “O prazo e o ritmo podemos negociar, mas não podemos prescindir da redução da jornada, fundamental para o Brasil continuar crescendo”, colocou.
Perdas tributárias
A representante da entidade Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lúcia Fattorelli, abordou a questão dos meses trabalhados pelos brasileiros apenas para o pagamento de impostos. Fattorelli acentuou que é inadmissível, em pleno século 21, ainda existir uma carga tributária elevada para os trabalhadores e defasagem da tabela de Imposto de Renda. “Os trabalhadores têm suas rendas confiscadas durante meses”, reclamou.
Da mesma forma, o especialista em políticas públicas Francisco de Souza Andrade reiterou que é importante realçar as conquistas que os trabalhadores conseguiram nos últimos anos, contanto que seja lembrado que a tributação continua sendo muito injusta. Souza também alertou para o fato do projeto da terceirização. A seu ver, caso seja aprovado da forma como se encontra, o PL “não trará segurança para os trabalhadores”.
Coube ao cientista político Antônio Augusto de Queiroz, o Toninho, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), fazer uma avaliação do trabalho legislativo desde a Constituinte de 1988. Segundo ele, todas as vezes, nos últimos anos, em que uma matéria tida como avançada para assegurar direitos aos trabalhadores começa a caminhar no Congresso, surgem interferências por parte do empresariado e argumentos de possíveis impactos na economia ou no nível de emprego. No entanto, na época da Constituinte, diversas matérias foram aprovadas, muitas delas tidas como conquistas para os trabalhadores, e o país vivia num momento econômico de recessão, bem diferente da atual conjuntura.
Mobilização
O líder do PT na Câmara, Vicente Paulo da Silva (SP), o Vicentinho, recordou sua origem como sindicalista e demonstrou apoio à pauta das entidades, mas pediu para os presentes lembrarem, também, de alguns avanços que foram obtidos nos últimos anos. “Se cada um de nós, deputados, for falar dos projetos apresentados, veremos que muitos foram aprovados. Temos evoluído em algumas questões”, acentuou. O líder destacou a importância da mobilização das entidades sindicais e disse que “se tem uma coisa importante para que esses projetos sejam aprovados é a mobilização popular. Vocês são os grandes responsáveis pelas vitórias obtidas, como o projeto que recupera o salário mínimo, por exemplo”, frisou.
O deputado Assis Melo (PCdoB- RS), por sua vez, afirmou que não é possível avançar no direito dos trabalhadores sem que questões vitais como as matérias de caráter fiscal e tributário sejam aprovadas. A deputada Erika Kokay (PT-DF), que já foi dirigente da CUT, também chamou a atenção para a importância de serem votadas proposições que permitam igualdade de condições para as mulheres em relação aos homens no trabalho. “Precisamos assegurar a equidade de gênero no local de trabalho”, colocou. Kokay ressaltou, ainda, a necessidade de ser aprovada, o quanto antes, a criminalização do assédio moral.
Participaram da comissão geral, além da CUT, representantes da Força Sindical, UGT, Confederação dos Servidores Públicos do Brasil, Nova Central Sindical, CSP-Conlutas, CTB e Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio (CNTC).