José Álvaro de Lima Cardoso
Os resultados do Produto Interno Bruto (PIB) de 2007, divulgados em 12 de março, superaram as expectativas da maioria. O PIB fechou 2007 com crescimento de 5,4%, o maior desde 2004, equivalente a R$ 2,6 trilhões. A expansão foi puxada pelo mercado interno, que contribuiu com 6,9 pontos percentuais no resultado do PIB. A demanda interna foi impulsionada pelo consumo das famílias, que cresceu 6,5% e pelos investimentos, que expandiram 13,4%. A alta verificada no consumo das famílias, um recorde na nova série histórica do PIB iniciada em 1996, só ficou abaixo de 1995, quando atingiu 8,6%. Segundo o IBGE, o vigor da demanda das famílias está relacionado ao crescimento da massa salarial (3,6%), a expansão de 28,8% no crédito para pessoa física e aos 20,3% de aumento das importações.
A partir da divulgação dos dados do PIB de 2007 as projeções de crescimento para 2008 mudam. Os 4,5% previstos pela maior parte dos economistas devem ser ajustados para cima. O crescimento vigoroso no quarto trimestre do ano passado se estendeu para 2008, o que deve garantir um crescimento superior em 2008 maior que o previsto inicialmente.
O controle da inflação continua sendo bastante ajudado pelo câmbio supervalorizado. Este é o lado positivo da valorização do real. Mas se o dólar continuar “derretendo”, corremos o risco de comprometer as contas externas, cuja melhoria nos últimos anos foi fundamental para a redução da vulnerabilidade externa do Brasil. O déficit em transações correntes alcançou US$ 1,2 bilhão em janeiro e as projeções para 2007 chegam a até US$ 20 bilhões de déficit. A preocupação com a apreciação cambial é especialmente relevante em face da crise estadunidense, que pode pegar o Brasil no segundo semestre, através da redução das exportações. Já em 2007, por conta da valorização cambial e da importação de bens intermediários para atender ao mercado interno, registrou-se uma queda no superávit comercial dos produtos da indústria de transformação, com destaque nos segmentos de alta e de média-alta intensidade tecnológica, cujo déficit conjunto atingiu US$ 25,2 bilhões.
Os dados do PIB de 2007, e o conjunto de indicadores econômicos da economia podem indicar que o atual processo de crescimento pode ser mais do que um “vôo de galinha”. O forte crescimento do mercado interno, aliado a robustez das contas externas, talvez esteja encaminhando o Brasil para um processo mais sustentando de crescimento, baseado no mercado interno. Um dos elementos-chave são as reservas internacionais, que têm permitido ao Brasil enfrentar a atual crise nos mercados de forma mais ou menos tranqüila.
Obviamente o Brasil não está livre de incertezas em função da crise do mercado imobiliário estadunidense e suas conseqüências sobre a economia mundial. Há um processo de agudização da crise financeira nos EUA, e no setor financeiro dos demais países, especialmente na área da União Européia. A crise começa a atingir fundos de investimento importantes, e alguns bancos começam a quebrar (Northern Rock, da Inglaterra, nacionalizado, e Bear Stearns, dos EUA, comprado na bacia das almas pelo grupo JP Morgan Chase, com forte apoio do Tesouro dos EUA e do Banco Central (FED) daquele país. O FED baixou duas vezes extraordinariamente a taxa de juros (0,5% e depois 0,25%), antes de sua reunião ordinária em março. A taxa de juros nos EUA já está em níveis negativos (abaixo da inflação). Enquanto isso, a Banco Central Europeu segue com taxas de juros mais elevadas, e a discussão na China é fundamentalmente o que fazer sobre a inflação (a medida inicial foi no sentido de deixar valorizar o yuan frente ao dólar dos EUA, e existe forte discussão do que fazer com as taxas de juros). O fato é que a situação internacional é cada vez mais complicada no campo financeiro, embora a crise até agora só tenha uma cara mais “produtiva” nos EUA;
Não há dúvidas de que a crise é um grande teste para as escolhas de política econômica dos últimos anos do governo brasileiro. Um aspecto favorável ao Brasil é o peso do crescimento chinês no crescimento da economia mundial, que hoje é maior do que o dos Estados Unidos. E a demanda chinesa por commodities, que explica boa parte do ajuste nas contas externas do Brasil, não dá sinais ainda de que vá diminuir.
As reservas internacionais brasileiras, de quase US$ 200 bilhões, são também um fator fundamental. Possivelmente em função delas, toda essa crise brutal até o momento não provocou fuga de capitais, a taxa de câmbio tem até apreciado em meio às turbulências. Uma variável macroeconômica fundamental será o comportamento do Copom nos próximos meses. Elevação dos juros básicos da economia neste momento seria um balde de água gelada nas intenções de investimento das empresas, o que poderia levar à interrupção do atual ciclo de crescimento.
*Economista e Supervisor Técnico do DIEESE em Santa Catarina
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